Professor doutor no Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (USP), Kai Enno Lehmann analisa em entrevista ao site do Instituto de Estudos Brasil Europa (IBE) como ficaram as relações entre o Brasil e a União Europeia após o acordo de parceria estratégica firmado em 2007 e os efeitos da crise europeia.

– Como avalia a parceria estratégica firmada entre o Brasil e a União Europeia em 2007?

Acredito que é possível melhorar. Tenho feito entrevistas sobre o assunto e sei que a Europa tem uma certa impaciência com o Brasil por causa do processo lento com que esta parceria caminha. A relutância em avançar neste sentido talvez seja explicada por outras iniciativas, como o Mercosul. A União Europeia tem a expectativa de avançar nas conversas sobre a abertura da área de livre comércio com o Brasil, mas este prefere fazer as negociações em bloco. Até o fim do ano, deveríamos saber mais sobre os rumos da parceria e se ela vai se desenvolvendo de forma mais bilateral ou dentro do contexto do bloco.

– A crise europeia também afeta esta parceria?

A parceria estratégica é lenta porque, por um lado, a crise da União Europeia em termos políticos não ajuda. A ideia do modelo europeu talvez tenha perdido força. Há problemas ainda da União Europeia com a Argentina, e essas divergências políticas entre os membros do bloco sulamericano atrapalham. Não é somente a União Europeia que tem problemas com a Argentina, os demais países sul-americanos também têm. Acho possível que todos os membros do Mercosul menos a Argentina apresentem até o fim do ano uma proposta para um acordo Mercosul-UE, inclusive o Brasil.

– É possível dizer que o Brasil pode, de certa forma, sair mais forte na relação com a Europa depois desta crise?

Politicamente eu não sei se o Brasil fica mais forte com a crise na relação com a Europa. Mas sei que a União Europeia fica mais fraca. O Brasil na verdade tem olhado a União Europeia com preocupação, porque se ela sofrer o Brasil também será afetado principalmente em relação ao comércio. O crescimento baixo do Produto Interno Bruto (PIB) mostrou isso. A UE em crise não ajuda o Brasil.

– Acredita que há divergências entre o Brasil e a União Europeia em alguns temas?

O Brasil tem mostrado certo desconforto com o envolvimento da União Europeia em conflitos regionais. Não sei se é mais por diferenças de valores ou é jogo político, porque o Brasil não quer abrir mão de sua influência. No caso de Honduras o Brasil adotou uma posição unilateral porque quer se projetar mais na região e o bloco atrapalharia. Economicamente talvez o Brasil seja também mais protecionista. Isso é normal. Essa diferença de postura e de discurso é natural. Nos anos 70 o discurso europeu não era tão liberal como hoje. Mas na Europa há tendências contraditórias hoje em dia. Há quem fale até em abandonar a UE.

– Acha mesmo possível que algum país membro da União Europeia deixe o bloco?

Em curto prazo nenhum país deixaria a União Europeia. O mais avançado ao falar sobre isso é o Reino Unido, onde o primeiro-ministro prometeu plebiscito caso ganhe as próximas eleições. Os outros países não porque os partidos do governo não abordam o tema. Mas alguns partidos de oposição falam abertamente. A possibilidade existe, mas ainda é improvável e se for será em longo prazo. A ideia dos políticos que defendem a tese é sair do braço político da União Europeia, mas permanecer como braço econômico.

 

(Fonte: Instituto de Estudos Brasil Europa)